Isso
aqui não é uma resenha tradicional é apenas um relato pessoal de um leitor (que
nas circunstâncias econômicas atuais) não teria condições de adquirir uma obra
de quadrinhos de excelente qualidade pelo razoável valor de R$ 31,90. Mas o
sacrifício valeu a pena. Não por causa de algum elemento extraordinário contido
nessa história em quadrinhos, mas justamente pela simplicidade e espontaneidade
com que Rafael Calça e Jefferson Costa se esmeraram ao sintetizar na HQ do Jeremias-Pele, um assunto inesgotável e intenso,
como o racismo.
Aqui
cabe a expressão mais óbvia: “...só quem viveu na pele pra saber!”, pois o que
fora ali registrado saiu em partes do suor e do sangue de quem vivenciou
episódios comuns a muitos negros no Brasil.
Não
sou ativista de movimento negro ou de movimento cultural nenhum, mas comprei
JEREMIAS por algumas razões e entre elas está o fato de ser ( embora não pareça
tanto ) filho de pai negro e de ter na mais nova criança, dos meus quatro
filhos, o mesmo tom de pele do Jeremias, em evidência.
Em
uma ocasião em que eu desenhava e pintava com minha filha de 3 anos, segurando
os lápis de cor, ela me perguntou: “Papai, eu sou marrom?” Ali estava eu, presenciando um dos primeiros
momentos de uma particular consciência negra se formando em um indivíduo, que
de forma muito peculiar, é diferente dos outros três irmãos do seu
convívio que são muito mais claros.
Diante
de uma necessidade de mostrar a ela alguns quadrinhos infantis, ficava a
questão: quais os referenciais na indústria cultural e na mídia a gente
encontra tendo negros como protagonistas? Isso sem falar do que seja apropriado
ou não para a idade da criança, que é outra questão seríssima.
Foi
também essa a dificuldade que os autores de JEREMIAS contaram em uma entrevista
no canal PAPO ZINE(*), onde eles falaram dessa escassez de referências.
E
mesmo que tenhamos notado uma presença maior do negro em campanhas
publicitárias (de uns dez anos pra cá) a Disney com a Doutora Brinquedo, a
Marvel com o Pantera Negra, tudo o que se tem, ainda é pouco. Nem cabe aqui
tratar das intenções mercadológicas que analisam a população negra, apenas como
um quantitativo de retorno financeiro, tal qual foi uma das verdadeiras
intenções da chamada abolição.
Para
quem se acha no direito de julgar o Maurício de Sousa, JEREMIAS-Pele, pode até
não redimir a falta com que o maior produtor de quadrinhos no país, não se
dedicou a temas afrodescendentes no Brasil. Mas o que tá valendo aqui e agora é
que o personagem Jeremias, renasceu! se valendo da mega-estrutura empresarial
da turminha do bairro do Limoeiro, com um alcance de público, que certamente
seria impossível, para dois profissionais de quadrinhos negros brasileiros.
Ficou
também o incentivo, para quadrinhistas afrodescendentes, se dedicarem ainda
mais a fim de obterem seus resultados pela qualidade do trabalho que fazem, e a
viverem muito acima das dificuldades raciais que enfrentam.
Vou
guardar essa graphic como um presente para a minha filha, que está sendo
alfabetizada agora, para que ela se divirta um pouco com as situações com que
ela, muito provavelmente, também viverá na mesma pele.
(*)Para ver a entrevista no canal
PAPO ZINE click no link abaixo:
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